A Afortunada de Deus
08 de fevereiro
“...Ainda embrião, teus olhos me viram e
tudo estava escrito no teu livro, meus dias estavam marcados antes que chegasse
o primeiro...” (Salmo 138,16).
É impossível não se encantar com a trajetória de vida de Santa Bakhita. Tudo em
sua vida é manifestação divina, é o próprio Deus dirigindo seus passos até
mesmo nos cruéis anos de escravidão.
Bakhita, um pouco anjo, um pouco criança, grande mulher, que foi elevada à
honra dos altares pelo caminho da obediência e da simplicidade.
A Escravidão
Bakhita nasceu no Sudão, região de Dafur na África, no ano de 1869 e através de
suas poucas informações sabemos que sua aldeia natal é Olgossa, cuja pronúncia
é “algoz”, que em árabe
significa “Dunas de Areia”.
De
família abastada, seu pai possuía terras, plantações e gado; ele era irmão do
chefe da aldeia. Sua família era composta pelos pais e sete filhos, sendo muito
unidos e afeiçoados.
Não devemos nos esquecer de que, apesar de possuírem terras, gado, etc., viviam
num aldeia onde as cabanas eram de barro com telhado de palha. Todos nas
aldeias estavam sujeitos ao grande perigo que eram os bandos negreiros que
raptavam homens, mulheres e crianças para negociar no mercado de escravos.
No ano de 1874, sua irmã mais velha foi raptada. A dor dilacerou o coração
daquela família tão unida e feliz.
“Bakhita” não foi o nome que
recebera dos pais quando nasceu. No ano de 1876, com mais ou menos 7 anos de
idade, foi raptada e arrancada do seio de sua família. A pequena menina tomada
de pavor, foi levada brutalmente por dois árabes e foram eles que impuseram o
nome de “Bakhita”, que significa: “afortunada”.
A pequena escrava, depois de um mês de prisão, foi vendida a um mercador de
escravos. Na ânsia de voltar para casa, Bakhita se arma de coragem e tenta
fugir. Porém, foi capturada por um pastor e revendida a outro árabe, homem
feroz e cruel, que, por sua vez, revendeu-a a outro mercador de escravos.
Novamente ela é vendida a um general turco, cuja esposa era mulher
terrivelmente má. Desejou marcar suas escravas e Bakhita estava entre elas.
Chamou então uma tatuadora que, com uma navalha, ia marcando os corpos das
meninas que se contorciam de dores, mergulhadas numa poça de sangue. Bakhita
recebeu no peito, no ventre e nos braços 114 cortes de navalha que eram
esfregados com sal para que as marcas ficassem bem abertas. A jovens escravas
foram jogadas sem tratamento e nenhum cuidado, durante um mês.
No ano de 1882, o general turco vendeu Bakhita ao agente consular Calisto
Legnani que seria, para ela, seu anjo bom. Na casa do cônsul, Bakhita conheceu
a serenidade, o afeto e os momentos de alegria, lembranças dos momentos felizes
na casa dos pais.
Em 1885 o sr. Calisto é obrigado a retornar à Itália; Bakhita pede para
acompanhá-lo e obtêm consentimento. E assim partiram em companhia de um amigo,
o sr. Augusto Michieli, a quem o cônsul presentearia em Gênova com a jovem
africana.
Chegando à Itália com seu 7º “patrão”, o rico comerciante Michieli, foi para
vila Zianino de Mirano Veneto onde Bakhita se tornou babá de Mimina, a filhinha
do casal. Apesar de serem pessoas boas e honestas, não eram praticantes de
religião. Como sempre, Deus tem seus caminhos e acabou colocando no caminho de
Bakhita, o administrador dos Michieli, Iluminato Chechini.
Iluminato era um homem muito religioso e logo se preocupou com a formação
religiosa de Bakhita; e ao dar um crucifixo a ela, disse em seu coração: “Jesus,
eu a confio a Ti”.
Quando os Michieli tiveram de voltar para Suakin, na África, por motivos de
negócios, Bakhita e a pequena Mimina ficaram aos cuidados das Irmãs
Canossianas, em Veneza, e isto graças ao sr. Iluminato.
Bakhita iniciou o catecumenato (catequese para receber os sacramentos
iniciais), no Instituto das Irmãs. Ao final de nove meses, a sra. Maria Turina
voltou à Itália para buscar sua filhinha Mimina e aquela que considerava sua
escrava, pois retornariam à África.
Naquele instante, Bakhira já toda apaixonada por Jesus, prestes a receber os
sacramentos, recusa-se a voltar para a África, apesar do afeto que nutria pela
família Michieli e principalmente pela pequena. Sentia em seu coração um desejo
inexplicável de abraçar a fé e vivê-la para sempre.
Apesar dos apelos e até ameaças da sra. Michieli, nossa jovem africana não
cedeu em sua minima resolução. Bakhita estava livre, na Itália não havia
escravidão. Sua patroa retornou à África com sua filha e Bakhita prosseguiu com
sua catequese, feliz mesmo sabendo que seria a última chance de rever seus
familiares na África.
No dia 09 de janeiro de 1890, Bakhita é batizada, crismada e recebe a 1° comunhão
das mãos do Patriarca de Veneza, Cardeal Agostini. No batismo recebe o nome de
Josefina Margarida Bakhita. Ela descreveria este dia como mais feliz de sua
vida: sentir-se filha de Deus era-lhe uma emoção inigualável, assim como
receber Jesus na eucaristia era o Céu na Terra.
Bakhita nutria em seu coração o sublime desejo de se tornar religiosa, uma Irmã
Canossiana. Josefina Bakhita foi aceita na congregação das Filhas da Caridade
Canossianas, servas dos pobres e, depois de três anos de noviciado, no dia 08
de dezembro de 1896 pronunciou os votos de: Castidade Pobreza e Obediência.
Depois da profissão religiosa, nossa Irmã Bakhita foi transferida para a cidade
de Schio, em outra obra da Congregação, e lá permaneceu por 45 anos, onde
passou a ser conhecida como a “Madre Morena”.
Irmã Bakhita era atenciosa com todos, sem distinção, desde as crianças do
colégio, seus pais, sacerdotes, com suas irmãs religiosas, etc., sempre levando
a todos palavras de conforto, consolo e amor incondicional a Deus Pai.
Em todas as funções que exerceu, sempre colocou seu coração doce e sincero na
Igreja, na Sacristia, na portaria ou na cozinha, era tudo para todos, com seu
sorriso de anjo.
Irmã Bakhita, em sua infância na África, mesmo sem saber nada de Deus, pensava
em seu coração inocente e puro, quando olhava a lua e as estrelas: “Quem
será o patrão de todas estas coisas?”. Oh! Bakhita, Deus já
estava te preparando para Ele!
Bakhita sonhava com a conversão do povo africano e, no dia de sua profissão
religiosa, rezou: “Ó Senhor, se eu pudesse voar lá longe, entre a minha gente e
proclamar a todos, em voz alta, a tua bondade. Oh! Quantas almas eu poderia
conquistar para Ti! Entre os primeiros, a minha mãe e o meu pai, os meus
irmãos, a minha irmã ainda escrava... e todos, todos os pobres negros da
África. Faça, ó Jesus, que também eles te conheçam e te amem!”.
No ano de 1947 Bakhita adoeceu, já quase sem forças, em cadeira de rodas,
passava horas em oração, em adoração e contemplação. Era o dia 08 de fevereiro
de 1947, nossa Irmã Morena murmurava: “Como
estou contente! Nossa Senhora! Nossa Senhora!”.
Depois de algum tempo, em seus últimos momentos, disse: “Vou-me
devagarzinho para a eternidade... Vou com duas malas: uma contém os meus
pecados; a outra, bem mais pesada, contém os méritos infinitos de Jesus Cristo.
Quando eu comparecer diante do Tribunal de Deus, cobrirei a minha mala feia com
os méritos de Nossa Senhora. Depois abrirei a outra e apresentarei os méritos
de Jesus Cristo. Direi ao Pai: ‘Agora julgai o que vedes’. Estou segura de que
não serei rejeitada! Então me voltarei para São Pedro e lhe direi: ‘Pode fechar
a porta porque eu fico!”
Às 20 horas, irmã Bakhita entrega sua alma a Deus. O povo em grande multidão
quer dar o último adeus à Madre Morena, sua fama de santidade se espalhou
rapidamente e todos recorriam ao seu túmulo pedindo sua intercessão.
Em 17 de maio de 1992 foi beatificada e, em 1º de outubro de 2000, foi elevada
à honra dos altares, declarada “Santa” pelo nosso Santo
Padre, o Papa João II, sendo que o milagre que a levou a ser reconhecida como
Santa, aconteceu em Santos, no Brasil.
Santa Bakhita deve sempre inspirar sentimentos de confiança na Providência,
doçura para com todos e alegria em servir.